A deputada Lídice da Mata (PSB-BA), juntamente com parlamentares do Psol, PT e PCdoB, apresentou uma queixa à cúpula da Organização das Nações Unidas (ONU), fazendo um apelo diante dos ataques e retrocessos para o aborto legal, promovidos pelo Governo Bolsonaro.
O Brasil assistiu – estarrecido – a notícia de uma criança de 10 anos abusada pelo seu tio desde os seis anos, que ficou grávida e conseguiu realizar o procedimento de aborto após decisão judicial. Não bastasse a situação enfrentada por ela e tantas outras vítimas de violência sexual no Brasil, o Ministério da Saúde editou Portaria, na sexta-feira (28), que, segundo as deputadas, dificultará o atendimento às vítimas.
A Portaria prevê que, na fase de exames, a equipe médica deve informar a vítima de violência sexual sobre a possibilidade de visualização do feto ou embrião por meio de ultrassonografia. Caso a gestante deseje ver o feto, deverá proferir expressamente tal concordância, de forma documentada. E desconsidera as determinações de procedimentos especiais que protegem a audição de crianças e adolescentes – escuta especializada.
A vítima deve ainda descrever a circunstância do estupro aos profissionais de saúde. O documento do Ministério da Saúde obriga ainda os profissionais de saúde a notificar as autoridades policiais dos indícios sofridos pela vítima e preservar possíveis evidências materiais do crime de estupro, como fragmentos de embrião e feto, no caso de aborto legal.
Muitas vítimas de estupro passam anos sem denunciar seus algozes, justamente por sentirem medo ou serem ameaçadas. A obrigação da denúncia dificulta a ida das vítimas aos hospitais. O aborto, em casos de estupro, é permitido pela legislação brasileira desde 1940.
No documento enviado à ONU, as parlamentares destacaram dados oficiais de 2019, em que quatro meninas de 13 anos são estupradas a cada uma hora no Brasil. “Em 2018, as meninas com menor idade representaram 53,8% dos 66 mil casos de estupro oficialmente notificados no País. Registros do Ministério da Saúde também mostram que, todos os dias, seis meninas entre 10 e 14 anos são internadas pela rede pública de saúde para abortos por estupro. Enquanto isso, todos os anos, cerca de 26 mil meninas dessa faixa etária dão à luz no Brasil”, disseram.
Para as deputadas, ao invés de criar um ambiente seguro e acolhedor para o aborto legal, a Portaria do Ministério da Saúde dificulta o acesso de mulheres e meninas a esse direito estabelecido. “A determinação colocará em risco a vida de milhares de mulheres e meninas, particularmente negras e pobres.” A queixa enviada à ONU sugere uma visita emergencial ao Brasil do Grupo de Trabalho da ONU sobre discriminação contra mulheres e meninas.
Projeto de Decreto Legislativo (PDL) –Nesse mesmo sentido, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), apresentou na Câmara o PDL nº 381/2020 para sustar a portaria do Ministério da Saúde. A deputada Lídice da Mata é coautora do PDL.
“Qualquer norma que ofereça constrangimentos para o exercício de um direito deve ser prontamente contestada. As mulheres vítimas de violência sexual são constantemente vitimizadas ao enfrentar o caminho para fazer valer sua opção pelo aborto legal. Na prática, a Portaria inviabiliza o atendimento das mulheres e meninas vítimas de violência sexual nos serviços de saúde, ao fazer tais exigências”, justificaram no projeto.
Com informações da Agência Câmara